PRODUÇÃO CIENTÍFICA

A Contribuição do Trabalho Indígena nas Entradas para o Sertão da Capitania de Pernambuco na Segunda Metade do Século XVII.
Spix e Maitius, Negociantes Contando Índios, Viagem pelo Brasil, 3 vols.

J. Babtiste Debret, Capataz de Escravos Índios, SP, Museu de Arte de São Paulo.


UNIVERSIDADE FEDERAL RURAL DE PERNAMBUCO
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO LATU SENSU EM HISTÓRIA

A Contribuição do Trabalho Indígena nas Entradas para o Sertão da Capitania de Pernambuco na Segunda Metade do Século XVII.

Lucileide Lima Tavares
Rogério Antonio de Araújo Santos

Setembro 2007

Trabalho monográfico a ser apresentado ao Programa de Pós-graduação lato sensu em história da Universidade Federal Rural de Pernambuco como requisito de obtenção do título de especialista.
Aluno(s): Lucileide Lima Tavares
Rogério Antonio de Araújo


Orientadora: Drª Ana Nascimento (Arqueóloga e Historiadora)

"Quero falar da descoberta que o eu faz do outro. O assunto é imenso. Mal acabamos de formulá-lo em linhas gerais já o vemos subdividir-se em categorias e direções múltiplas, infinitas. Podem-se descobrir os outros em si mesmo, e perceber que não se é uma substância homogênea, e radicalmente diferente de tudo o que não é si mesmo; eu é um outro. Mas cada um dos outros é um eu também, sujeito como eu.somente meu ponto de vista, segundo o qual todos estão lá e eu estou aqui, pode realmente separá-los e distingui-los de mim. Posso conceber os outros como uma abstração, como uma instância da configuração psíquica de todo indivíduo, como o outro, outro ou outrem em relação a mim. Ou então como um grupo social concreto ao qual nós não pertencemos. "

(TODOROV, 1999: 03)

Agradecimentos

Este trabalho, sem dúvida, é produto de um esforço acadêmico conjunto. Entre os anos de 2002 a 2003 estive vinculada ao Grupo de Estudo História Sócio-Cultural da América Latina, coordenado pela professora da UPE/FFPNM, Drª Kalina Vanderlei, que com plena dedicação iniciou vários alunos ao mundo da pesquisa. Sem dúvida começo meus agradecimentos à mesma.
Existem ‘aqueles que passam por nós, não vão sós, citação de Antoine de Saint- Exupéry que agradeço a vocês: Leandro Sena, Rogério Antonio, Cláudio de Oliveira e Roberta Mary.
Além do mundo dos arquivos que me levam a realizar esse trabalho, existe outro mundo, que é a minha paixão platônica, o mundo da cultura material, e sem dúvidas existem pessoas que me ajudaram em momentos em que achava que não suportaria me aventurar mais por ‘Terras de Gigantes’, me deram as mãos e me presentearam com palavras realistas, agradeço em demasiado as professoras e arqueólogas Drª Ana Nascimento (orientadora do presente trabalho) e a Drª Suely Luna.
E ainda imersa nessa ‘Terra do Nunca’ a minha ‘arqueólogamiga’ Vivian Karla de Sena, que sempre apoiou os meus índios trabalhadores, nossas ‘Desventuras em Série’ estão aqui!
E existe uma galera maravilhosa que trabalham feito uns loucos e não tomam prozac! Os admiro por demais, pessoas que me inspiram a cada dia a compreender a importância do ensino na vida da humanidade, sendo assim, obrigada por tudo: Naura & Everaldo, Perseu, Lívio, Lamartine, Jaciara, Jaqueline, Sheila, Nicanor, Lira, Lindalva, Socorro, Walquíria, Naira e Aliete (Diretora do Custódio Pessoa), a deixando por último porque não dá para delinear as inúmeras ajudas que a mesma me concedeu durante a elaboração da monografia.
Ao amor da minha vida, agradeço a sua vida em minha vida, “Heitor Diniz”. E por fim, a ‘mainha’ e ‘painho’ POR TUDO!
Lucileide Lima Tavares


Inicialmente manifesto meus agradecimentos a Deus por ter-me concedido a vida com seus desafios, fracassos e sobretudo vitórias.
A minha eterna gratidão ao amor manifestado pelos meus pais, Antonio Sebastião dos Santos e Maria de Lourdes Jeronimo de Araujo Santos, ao longo de mais de um quartel de século. Numa manifestação de total desapego as vaidades pessoais e sempre construindo o bem-estar familiar.
Agradeço a minha querida irmã, Rosineide de Araújo Santos, que apesar da aparente falta de afinidade, sempre demonstrou sua atenção, respeito e sua admiração pela minha pessoa e pela minha formação. E faço envolver esse espírito de gratidão a todos os meus familiares.
Declaro o meu profundo apreço e gratidão a uma pessoa que sempre acreditou no meu potencial e aquém reservo minha total admiração, ao senhor, Luís Batista de Lira,
meus sinceros agradecimentos.
Registro o meu muito obrigado a Lucileide Lima Tavares por ser uma pessoa admirável no campo profissional, pessoal e dentre vários outros aspectos. E destaco a habilidade de trabalhar com a minha pessoa.
Diante de um momento ímpar da minha vida reverencio a minha linda flor, Karina Correia da Silveira, por todo sentimento que compartilhamos. E em extensão a todos os membros da família Silveira que fraternalmente acolheram-me no seu seio familiar.
E por fim a todos os amigos que com o transcorrer do tempo à vida exigi que os referenciassem de irmãos como: Leandro Sena, Normando Albuquerque, Roberta Mary, Cláudio Oliveira, Nicanor Valerio e entre tantos outros. A eles o meu sincero agradecimento.
Rogério Antonio de Araujo Santos

Resumo

A presente monografia tem como objetivo analisar o processo colonizador no território do nordeste brasileiro, e em particular, a veiculação da utilização da mão-de-obra indígena no âmbito da economia colonial. Exigindo para isso uma reflexão no tocante aos desdobramentos religiosos, e a discussão de elementos norteadores na estruturação do uso da mão-de-obra indígena compulsória.
A partir de uma revisão bibliográfica, combinada a uma análise documental obtida junto ao Arquivo Histórico Ultramarino (AHU), e a Coleção de Documentos Históricos (DCH), a primeira obtida na divisão de pesquisa do CFCH da UFPE, e a segunda na biblioteca Central da UFPE, através deste trabalho, realizar um panorama no que diz respeito ao tocante ao tema, que para determinados momentos históricos é relegado a explicações simplistas.
O Segundo Período Português apresenta uma desarticulação na economia que foi abalada pela invasão holandesa (1630-1654). Momento de pós-expulsão era tempo de restaurar a colônia, tanto economicamente como politicamente, a economia da cana-de-açúcar não era mais a mesma do período anterior à invasão. Sendo assim, o século XVII, constituiu uma das etapas de maiores dificuldades na vida política colonial.
E é a partir desse ângulo e de suas problemáticas, que nos baseamos para dar ênfase e observar como desencadeou a exploração do trabalho indígena na Capitania de Pernambuco em conseqüência da crise desencadeada pelas ‘guerras de reconquista. ’
A utilização da mão-de-obra indígena na Capitania de Pernambuco na segunda metade do século XVII, segundo dados levantados, foi algo corrente e acentuado. A crise da economia açucareira desencadeada pela destruição de diversos engenhos na guerra contra os holandeses, e a concorrência do açúcar no mercado internacional, seja o produzido nas Antilhas, ou o açúcar europeu ‘extraído da beterraba’, configurou uma intensa busca por mão-de-obra mais em conta, para dar início a um novo momento da economia colonial, onde o trabalho indígena teve participação assídua no cenário do nordeste colonial.

Abstract

The present monograph intends to analyze the colonization process, particularly the application of the indigenous labor, demanding a reflection about the religious unfoldings and discuss the elements concerning the structure of the usage of labor, either compulsory or slave.
From a bibliographic revision combined to a documental analysis obtained from the Overseas Historical File (AHU) and the Historical Collection of Documents (DHC), the first acquired in the division of research of the CFCH from UFPE (Federal University of the State of Pernambuco) and the second at the Central Library of the same University. Associated to an iconographic research, it intends to realize a panorama concerning this subject that for determined historical moments is relegated to simplistic explanations.
The Second Portuguese Period presents a disarticulation on the economy that was affected by Dutch invasion (1630-1654), being the moment of post-expulsion and the time to restore the colony politically and economically. The sugarcane economy was not the same from the period before the invasion. Thereby, the 17th century was characterized as one of the most troublesome in the colonial political life.
It is from the problematic analysis of this period that we should base our opinion on how unchained the free and slave labors in the region of the Captaincy from North with the crisis due to reconquest wars. .
The utilization of the indigenous labor in the Captaincies from North in the centurie of XVII, according to the gathered data, was something common and accentuated. The crisis of the sugar economy from several sugar mills destroyed due to the war between “settlers x Dutch” and the competition of the sugar in the international market, either produced in the Antilles or the European sugar extracted from beet, unchained an intense research for inexpensive labor to begin a new movement of the colonial economy.

Introdução

A proposta do presente trabalho, é realizar uma compreensão por meio de análises textuais e documentais que colaborem para o estudo do trabalho indígena na reestruturação da Capitania de Pernambuco na segunda metade do século XVII.
Momento particularmente ímpar, para trabalhar a questão da exploração do trabalho indígena, principalmente no que se refere a atual área do nordeste brasileiro, abalada no momento pela crise decorrente a Insurreição Pernambucana[1], onde colonos e holandeses, objetivando o domínio da região da produção açucareira, entraram em conflitos finalizando com a expulsão dos flamengos em 1654.
Quando nos detemos à análise do trabalho indígena, seja ele compulsório ou escravo, apoiados rigorosamente por justificativas ‘legais’ (legislação indígena), o projeto de colonização tinha em seu corpo de interesses e praticidade aproveitar como mão-de-obra o trabalho dos nativos. Principalmente ao que diz respeito à situação econômica dos primeiros colonos aqui estabelecidos, e a realidade financeira da própria metrópole que sem recursos suficientes adotou o sistema das Capitanias Hereditárias[2], que já havia dado bons resultados na ocupação das ilhas do Atlântico, especialmente na ilha da Madeira, dando-se início ao processo colonizador do Brasil.
Para o início do desenrolar da história do Brasil Colônia, encontra-se historiograficamente pontuada a contribuição do trabalho indígena seja ele livre ou forçado para a dinâmica econômica do projeto. Há diversos relatos sobre o trabalho indígena escrito por cronista no decorrer dos primeiros momentos de ocupação, temos relato de trabalho no corte e transporte do pau-brasil, como aliados aos portugueses nas guerras contra tribos inimigas, como empregados domésticos, e na incipiente indústria açucareira na primeira metade do século XVI. Entre outros exemplos a serem discutidos no corpo do trabalho.
Comprar escravos africanos no início da colonização não era prática nada fácil, e muito menos acessível a qualquer um. Diante desse panorama, a seguinte monografia trabalhará a abordagem da utilização da mão-de-obra indígena avaliando empreendimentos pontuais de alguns focos econômicos concentrados na região da Capitania de Pernambuco.
De acordo com os pontos selecionados, abordaremos questões de ordens sócio-econômicas e geográficas que auxiliaram na compreensão da absorção do trabalho indígena na engrenagem e necessidade produtiva colonial.
O trabalho concentrou-se na análise de autores que se dedicam a abordagens relacionadas ao primeiro momento lusitano na colônia, para termos uma idéia do contexto de exploração do trabalho indígena no início do projeto colonizador, e em autores que trabalham o segundo momento, o período pós-guerra. ‘O Segundo Período Português’, seu estudo é de extrema importância para observarmos que o indígena não cristalizou com o decorrer da história como indivíduo de cocar, maracá e pinturas corporais, e muito menos foi exterminado por completo, sendo assim, sua participação na realidade sócio-econômica do Brasil Colônia foi de intensa importância para os empreendedores debilitados financeiramente.

CAPÍTULO I

Pesquisando, Construindo: Posicionamento Historiográfico

“(...) a nova história começou a se interessar por virtualmente toda a atividade humana. Tudo tem uma história, ou seja, tudo tem um passado que pode em princípio ser reconstruído e relacionado ao restante do passado. (...) O que era previamente considerado imutável é agora encarado como uma ‘construção cultural’, sujeita a variações, tanto no tempo quanto no espaço.” (BURKE, 1992:11).

Faz muito tempo que deixamos de contar simplesmente os fatos, como se realizássemos algum tipo de radiografia clara e límpida, enquanto, nas últimas três décadas, deixamos de acreditar que o historiador revela um suposto ‘passado-coisa’, para usar a expressão de Jacques Le Goff, que estaria pronto e organizado à sua espera. Mais do que nunca, descobrimos que a história é plural, assim como o passado que narra, e que não pode ser reduzida a uma única forma e conteúdo.[3]
Assim o historiador não se resume a um mero repassador de informação, ele é um edificador, um crítico que através de fontes adquiridas em documentos constrói novas vertentes, plantando novos questionamentos sobre a história. Este novo comportamento objetivava não apenas resgatar o que já é nítido, mas também, o que se encontra encoberto por algum motivo. O europocentrismo foi, e ainda persiste na base construtiva da nossa história, faz parte da análise crítica do pesquisador analisar os códigos binários, as dualidades, e realizar uma pesquisa que não dê preferência ao arbitre entre o bom e o mal, mas, tentar analisar e esclarecer o porquê do comportamento dos personagens históricos.
E é de acordo com estes pensamentos que apresentamos nossa pesquisa, de forma incipiente estamos tentando avaliar com um olhar mais límpido a questão do trabalho indígena. Vê a documentação, os escritos em geral, sem conceitos pré-estabelecidos.
Perdendo a inocência, valendo salientar que, não sabemos até que ponto podemos chamar as informações encobertas que foram deixadas por muito tempo nessa situação de mera inocência. Diante da situação atual passamos a refletir sobre os discursos históricos, ou mesmo a psicanalisá-los e a desconstruir as interpretações históricas dominantes. É interessante notar, nesse sentido, que cada vez mais procuramos conhecer um determinado objeto histórico muito mais como construção do que como realidade, historicizando as práticas que o engendram, como explica Paul Veyne, e incorporando, ao mesmo tempo, a dimensão da subjetividade tanto dos protagonistas, quanto do próprio historiador. O documento, portanto, já não é uma ‘janela transparente para o passado’, como diz Nietzsche, a partir da qual a realidade se mostra nitidamente, mas uma materialidade, um discurso também, ou um ‘monumento’, na expressão de Foucault, acúmulo de interpretações superpostas. [4]
O conhecimento do social, uma observação crítica, nos proporciona mais oportunidades para ver os fatos explícitos e implícitos, conseqüêntemente nos interessa tanto a vitória quanto à derrota dos grupos fortes e fracos, contribuindo também, um conhecimento do presente.
Se o pesquisador tem como objetivo recuperar a problemática vivida pelos agentes em estudo, necessita acompanhar o processo de constituição dos atores sobre suas experiências. [5] Sendo assim, tendo o cuidado de organizar criticamente seu comportamento diante da pesquisa, pois segundo Laplace: O acesso a maior número de dados não faz de um imbecil um sábio.[6] É diante dessa reflexão, que tentamos nos policiar, selecionando na medida do possível as informações que de fato se apresentaram como imprescindíveis de serem trabalhadas. Afinal, quando voltamos o olhar para um determinado tema, e começamos a analisar com esse olhar perspicaz, parece que tropeçamos nas documentações que retratam o trabalho indígena, não apenas para o primeiro momento da colonização, mas, para os momentos posteriores.
Mesmo diante da variedade de informações, absorvemos por meio das leituras, que as informações científicas não são pura e simplesmente um ‘dado’. É algo que requer estruturação, estando mais próxima, portanto, daquilo que também chamamos de conhecimento[7] .
Pesquisar não é uma tarefa fácil, pois novamente enfatizando Laplace, muitas informações não fazem de um leigo um sábio, tem que saber o que queremos, o porquê de estarmos pesquisando sobre determinado assunto. Encontrar as dúvidas, as perguntas e diante destas, controlar a ansiedade de uma resposta precoce, pois segundo Hobsbawn: Se tudo isso chega a fornecer uma explicação adequada, ou ao menos uma explicação verificável, não se pode ter certeza, apenas iniciar a investigação. [8]
Então, diante do pensamento de Hobsbawn, das colocações anteriores sobre a construção da ‘pesquisa histórica’, é que o presente trabalho apresentado, tem como objetivo fornecer abordagens sobre a utilização da mão-de-obra indígena utilizada na formação das Capitanias do Norte, em particular na Capitania de Pernambuco, sem pretensões maiores, apenas desejando trabalhar problemáticas historiográficas, no caso dessa monografia, tentar de forma sistemática apresentar para o leitor, informações que o proporcionará terem um olhar mais analítico e crítico ao trabalhar a questão do ‘trabalho no período colonial’, deixando de dar ênfase apenas ao trabalho dos escravos de procedência africana, mas colocando o trabalho indígena como algo corriqueiro na dinâmica da economia colonial.
Enfim, aqui não desejamos apresentar um vencido ou um vencedor, e sim a contribuição da participação do trabalho dos grupos étnicos no decorrer da história colonial. Um olhar que não vai nem exterminar, nem salvaguardar o índio dentro de uma tribo longe dos focos de colonização. A nova história, a história vista de baixo, metaforicamente com cuidados para não bater nem acalentar o nosso objeto de estudo. A história é como uma criança, não se pode exagerar nem para o bem, nem para o mal!

CAPÍTULO II

Contexto Histórico: O Segundo Período Português

“o período posterior a 1654 foi extremamente difícil para a economia açucareira no Brasil. Segundo Stuart Schwarz, se é verdade que fatores internos penalizaram a atividade produtiva, tais como epidemias, secas e outras calamidades naturais, os problemas mais fortes residiam em fatores externos: o crescimento da concorrência interimperial, com a ascensão da produção antilhana e, a partir de 1680, a conseqüência da inflação dos preços dos escravos, dado o aumento da procura em África. Neste sentido, a Coroa procura uma alternativa para repor as perdas no trato colonial. Expedições ao interior, antes até desencorajadas, passaram agora a receber apoio e mesmo a ser agenciadas pelo governo geral.”(PUTONI, 1980: 15)
Dando início a análise sobre o período apontado, tentando observar o contexto no qual ocorreu a utilização da mão-de-obra indígena nas províncias das Capitanias do Norte, e em particular na Capitania de Pernambuco, começaremos ressaltando as características sócio-econômicas e política desse momento, especificamente em Pernambuco (centro concentrador da economia colonial nos primeiros anos de atuação lusitana) antes, durante, e pós-invasão holandesa. Período esse, onde destacamos diversos conflitos armados entre colonos e indígenas, e além desse fato, informações correlacionadas a utilização do trabalho indígena nos empreendimentos coloniais.
O momento é o ‘Segundo Período Português’[9] que tem início em 1654 com a expulsão dos holandeses e com a política de restauração da Capitania de Pernambuco. As décadas que se seguem a 1654 trazem importantes mudanças para a essa região. A expulsão da Companhia de Comércio Holandesa, que governava a região até então, gera promessas de prosperidade às elites. No entanto, a prosperidade permanece na promessa durante a segunda metade do século, devido principalmente ao estado devastado das terras açucareiras. Além disso, o início da jurisdição portuguesa significa o início de uma nova fase política: a capitania deixa de ser donatorial e passa a ser régia. É a primeira vez que a Coroa Portuguesa consegue ter gerência sobre a Capitania de Pernambuco. Mas essa mudança política é apenas parte das conturbações pelas quais passa a sociedade colonial da região. [10] Como já foi relatado, será dado enfoque ao que ocorreu um pouco antes da expulsão da Companhia de Comércio Holandesa.
A formação de um sistema econômico de alta produtividade, e em rápida expansão na faixa litorânea do nordeste brasileiro, iria acarretar conseqüências diretas e indiretas para as demais regiões da colônia. Havia surgido no mercado, à produção da cana-de-açúcar, capaz de justificar a existência de outras atividades econômicas. O que se pode observar é que a dimensão da economia açucareira, conseqüêntemente, gera outras necessidades para a população que atuam em torno dela, e é isto que dará âmbito para novas rotas à procura de suprir suas lacunas.
Pode-se admitir como ponto pacífico, que a economia açucareira constituiu um mercado de dimensões relativamente grande, podendo, portanto, atuar como fator altamente dinâmico do desenvolvimento de outras regiões da colônia. Essa característica fica explícita nos estudos sobre o período da economia mineradora na região das Minas Gerais, onde havia uma necessidade vital da absorção de produtos de outras regiões, pois as forças na região se concentravam no momento na exploração do metal precioso. No caso do litoral açucareiro, essa necessidade vai ser vigente também, deflagrando o surgimento da necessidade de exploração de outras áreas que produzisse o que o litoral não supria.
Mesmo depois das Guerras de Restauração, onde o açúcar e sua indústria nacional não são a mesma do início, ele ainda atua como personagem principal da história, dando força para esses mercados que surgiram de acordo com a sua necessidade. Nas primeiras décadas dessa nova fase, o açúcar ainda é o principal gênero colonial a suprir as rendas da Fazenda Real.
É nesse contexto de necessidade gerada pela economia açucareira, que vem a surgir às entradas para o sertão, visando utilizar a área geográfica para a criação de gado, mas também, como espaço a ser explorado através de buscas de outras fontes rentáveis, como no caso dos metais preciosos.
Podemos observar como foi trivial essa utilização da mão-de-obra nativa analisando o caso de São Vicente, onde a escassez de mão-de-obra resultou ser maior do que na Nova Inglaterra – o excedente de população nas Ilhas Britânicas tornou possível importar mão-de-obra européia em regime de servidão temporária, a primeira atividade comercial a que se dedicaram os colonos foi à caça ao índio. Dessa forma, voltou-se para o interior e se transformaram em sertanistas profissionais. Assim como os portugueses no século XV
penetraram no território africano na caça de escravos negros, os habitantes de São Vicente serão levados a penetrar a fundo nas terras americanas na habilidade exploratório-militar, qualidade esta que veio a constituir o fator decisivo da precoce ocupação de vastas áreas centrais do continente sul-americano.
Como Portugal não possuía o mesmo contingente populacional para utilizar como mão-de-obra nas atividades da colônia, teve que investir nos apresamentos indígenas e depois na implantação do escravo africano. O apresamento dos indígenas vai ser realizado em quase todo território da colônia, como ocorreu no sertão pernambucano, resultando no apresamento e aldeamento dos grupos indígenas.
O único artigo de consumo de importância que podia ser suprido internamente era a carne, que figurava na dieta dos escravos. A criação do gado no interior da colônia tem o objetivo de abastecer o litoral com o suprimento da carne, pois como as terras do litoral eram utilizadas exclusivamente para a agricultura da cana-de-açúcar, sendo a cultura que mantinha a economia, era quase impossível a sua importação, tanto pela parte da conservação como o valor que era muito alto para os senhores de engenhos, assim a produção no interior além da praticidade, seria favorável para a economia interna.
Por outro lado, logo se evidenciou a impraticabilidade de criar o gado na faixa litorânea, isto é, dentro das próprias unidades produtoras de açúcar. Os conflitos provocados pela penetração de animais em plantações devem ter sido grande, pois o próprio governo português proibiu, finalmente, a criação de gado na faixa litorânea. E foi a separação das duas atividades econômicas, a açucareira da criatória que deu lugar ao surgimento de uma economia dependente na própria região nordestina.
A essas características se deve que a economia criatória se encontre transformada num fator fundamental de penetração e ocupação do interior brasileiro. Mas a ocupação de determinadas áreas do interior do nordeste colonial, não ocorreu apenas por conta da economia criatória, mas pela implantação de outros empreendimentos econômicos como inicialmente apontamos, tendo como exemplo a extração de metais preciosos.
Assim, como na extração de minério que utilizou a mão-de-obra indígena, também na atividade criatória houve o recrutamento de indígenas. Estes recrutamentos eram realizados enfrentando uma forte resistência desses grupos, que resultou na conhecida Guerra dos Bárbaros[11], que teve como palco dos mais violentos os conflitos no território do Rio Grande do Norte.
Nesse momento de crise, a Capitania de Pernambuco estava passando pelo processo de Restauração pós à expulsão dos holandeses, fora a concorrência com o açúcar das Antilhas e depois o derivado da beterraba na Europa. Dessa forma quanto menos favoráveis fossem as condições da economia açucareira, maior seria a tendência migratória para o interior, e menos recursos teriam para a obtenção da mão-de-obra escrava africana, utilizando o excedente nativo.
Com a expulsão dos holandeses e o restabelecimento do Senado da Câmara em natal, em 1659, observamos manifestações em busca de indivíduos para se deslocarem para as regiões abandonadas ou desconhecidas, valendo salientar que essas áreas geralmente estavam ocupadas por grupos indígenas. Foram publicados avisos nas capitanias da Paraíba e de Pernambuco, para que os luso-brasileiros que tivessem terras na capitania do Rio Grande viessem retomar sua posse no prazo de seis meses. Caso não o fizesse nesse tempo, as terras seriam consideradas devolutas e, portanto, passíveis de serem concedidas novamente. Antonio Vaz Gondim teria promovido a vinda de cento e cinqüenta moradores e de três companhias de infantaria para reiniciar a vida da capitania. No entanto as novas necessidades da colônia levariam a um redirecionamento geo-político e econômico, que reavaliaria as áreas impróprias para a cana-de-açúcar, isto é, aquelas que se afastam do litoral em direção ao que ficou conhecido como sertão. Devido às diversas condições, físicas e econômicas, a pecuária se tornaria à atividade que aí se desenvolveria em larga escala, intensificando-se, então, a doação dessas terras.
As guerras dos holandeses contra os portugueses colaboraram para a saída da colônia de vários portugueses; com a expulsão destes e o processo de restauração houve como estar citadas no parágrafo anterior, promoções para a volta ou vinda de portugueses para ocupar as áreas antes ocupadas pelos holandeses, afinal, os engenhos estavam devastados, tanto maquinaria como áreas de plantação, além dos prédios públicos. O que surge por entre a poeira é uma área açucareira destroçada, uma monumental dívida de guerra, assim para se fixar nos engenhos o proprietário deveria ter um bom capital, mas como o aspecto econômico era outro, nem todos os colonizadores se dirigiram para o litoral, tomando assim destino para as áreas mais interioranas da colônia, e como já foi relatada, a crise do açúcar abre espaço para outras economias, e vai refletir na atividade da pecuária, da mineração entre outras na região sertaneja.
Teve assim o nordeste, em pouco menos de duzentos anos de efetiva presença colonial, devastado uma boa parte do seu território e, mais que isso, definidas as bases de toda a sua vida econômica ulterior. Vale ressaltar, porém, que os seus contornos regionais tal qual hoje conhecidos, só se tornariam nítidos no contexto do empreendimento colonial e no da própria nacionalidade brasileira emergente, a partir do século XVIII, marcados sobretudo pelo processo histórico da sua marginalização, com as descobertas das minas e conseqüênte deslocamento do pólo econômico para o Sudeste.
É interessante observar nas citações dos autores que geralmente trabalham com esse período, a questão de não tocarem no assunto sobre exploração mineral no sertão nordestino, nem de outras atividades afins, canalizando para esta região apenas o fato da existência da economia criatória e declarando o deslocamento da economia do nordeste para o sul com o processo de exploração da mineração na região das Minas Gerais, e de certa forma deixando de explorar dois pontos cruciais na história das Capitanias do Norte: A questão do trabalho indígena, seja ele livre ou escrava, e a intensa busca por minérios na região sertaneja do nordeste colonial, e valendo destacar o ponto de convergência que é justamente esses dois itens se encontrarem com a questão da extrema necessidade que era a busca por novas alternativas para recuperar a economia colonial, e a falta de recursos para a obtenção de mão-de-obra escrava africana em decorrência a crise instalada com as guerras de restauração, sendo o trabalho nativo uma alternativa.
Mas não podemos com isso declarar que a historiografia brasileira menosprezou até certo momento esse fato, podemos tentar avaliar pelo ângulo das vantagens econômicas e realizar uma análise comparativa, afinal o ciclo da cana-de-açúcar repercutiu mais no mundo econômico que a exploração de minérios na região das Capitanias do Norte, em especial a Capitania de Pernambuco. Primeiro, o minério explorado no sertão de Pernambuco era importante como matéria-prima utilizada na produção da pólvora, sendo importante em um momento em que para se expandir pelo sertão era necessária munição, e ter a possibilidade de produzir pólvora no território colonial era ideal, principalmente diante do contexto econômico pós-expulsão holandesa. Mesmo assim, a lucratividade em explorar salitre não era a mesma da extração de ouro, prata e pedras preciosas. As entradas para os sertões tinham também como objetivo, encontrar as rotas ao oeste que levassem até a mina de prata de Potosí[12], situada no atual território Boliviano. Temos para o nordeste documentações sobre a existência de minas de prata em Itabaiana, mas não dá suporte informativo sobre a escala de lucratividade desse minério e informações maiores, sendo assim não iremos trabalhá-las no presente trabalho. Novas buscas documentais poderão dá explicações mais amplas. É válida a realização de trabalhos que explorem a questão dos interesses de cada região, o fato de ter o minério desejado não significa suprir os interesses econômicos vigentes, seja por conta financeira de recursos suficiente para a exploração do minério, seja pela pouca demanda, entre outros motivos.
Na América Espanhola a exploração de minério era o que dinamizava a economia, a agricultura era uma coadjuvante diante dos protagonistas ‘Prata e Ouro’, a agricultura era geralmente de subsistência ‘haciendas’[13], em geral eram produtos tropicais, em alguns casos sua produção era destinada a exportação.
Ao contrário do que foi inserida no imaginário nacional a mão-de-obra indígena foi intensamente utilizada no Brasil, o que ocorre é que mesmo essa utilização sendo assídua, havia a necessidade da omissão pelo usuário, pois não agradava a Coroa o surgimento de um mercado interno gerado pelo aprisionamento e comercialização da mão-de-obra nativa no interior da colônia, isso poderia atrair os latifundiários que iriam adquirir mão-de-obra a um preço menor comparado aos escravos africanos, fazendo com que a metrópole saísse perdendo com o seu mais lucrativo negócio que era o do tráfico negreiro.
Então um dos objetivos dessa pesquisa, além de apresentar o panorama da utilização da mão-de-obra indígena na Capitania de Pernambuco, é, também, de forma incipiente, pincelar como desencadeou esse processo na América Portuguesa e com mais intensidade na Capitania de Pernambuco, afinal o que vem a ocorrer em Buíque, com a extração do minério salitre, e as diversas atividades que surgem em torno desse empreendimento, é justamente uma conseqüência dessa conjuntura econômica predominante e camuflada no Brasil nos séculos XVI, XVII e XVIII, onde o trabalho indígena era fato. Essa situação era pragmática e barata para os proprietários de empreendimentos, seja engenhos-de-açúçar, áreas mineradoras ou fazendas de gado. Enfim, a obtenção de escravos africanos era uma imposição da coroa, onde o lucro do tráfico era tão intenso quanto o da produção açucareira.
Apesar de não haver uma larga abordagem historiográfica, o trabalho livre que se apresentava de forma ‘compulsória’ e escravo indígena, desempenharam um papel de grande impacto não apenas sobre as populações nativas como também na constituição da sociedade e economia colonial. Em sua dimensão mais negativa aliando-se às doenças contagiosas a escravização dos índios, isso concorreu para o despovoamento de vastas regiões do litoral e dos sertões mais acessíveis aos europeus. Ao mesmo passo, porém, os cativos, deslocados de suas aldeias e terras para as unidades de produção e aldeamentos coloniais, viam-se obrigados a recompor suas vidas e sua identidade dentro deste novo contexto

CAPÍTULO III

O trabalho indígena na América Portuguesa

“Deste trabalho se vestem a maior parte das índias, não só da Vila de Santarém, mas também as da Vila Franca e Alter do Chão. Um pacará ordinário não custa menos de 1.600, comprado às índias nas povoações. Na cidade sobe o seu preço de 3 até 4.000 réis. Um tabuleiro vale 1.200 na povoação e chega a 2.000 réis na Cidade. Pelo preço de 160 se compra cada chapéu que na cidade custa 400 réis. Mas esta indústria não é tão proveitosa às índias, como parece. Os Diretores e os Comandantes dentro de 3 ou 4 anos, não só pretendem desempenhar-se, mas segurar o bolo para o resto de suas vidas. A título de empregarem as índias em algum trabalho lucrativo para elas e evitarem a ociosidade, distribuem por elas, e principalmente pelas mestras, diversas encomendas de pacarás, tabuleiros, chapéus, etc., não para as pagarem à razão dos 1.600 e 1.200, que valem, e cujo valor hão de dobrar na Cidade, mas para lhes pagarem por dia à razão de 40 réis. Isto não em dinheiro, logo que acabem a obra, mas em panos de algodão, em alguma barganha avariada e avaliada ao seu arbítrio, quando lhes chega na cidade. Se a índia, que bem percebe a desigualdade do partido, se demora mais tempo do que o consignado pelo Diretor para concluir a obra, é notada de preguiçosa e castigada com palmatoadas ... Conjeture-se, pelo que digo, qual é o estímulo que deve ter esta gente para aumentar a sua indústria, vendo ela que todo o seu trabalho cede em proveito dos brancos, e, se não cede, é punida como incúria própria”.(FERREIRA, 1974: 47-48)

Há cinco séculos iniciava-se na América o processo de conquista e exploração do continente pelas metrópoles ibéricas. Observamos o uso de estratégias utilizadas para colonizar o território, utilizando o indivíduo nativo já estabilizado em território americano, proporcionando em demasiado, informações e força (energia) de trabalho para a edificação das colônias americanas.
A partir do ângulo religioso, destacamos o comportamento incorporados pelas ordens religiosas para camuflar a exploração ilícita do trabalho indígena, temos já de antemão a contribuição da obra de Leandro Karnal , ‘Formas de Representação Religiosa no Brasil e México do Século XVI’, que por meio de análises em documentos desse período, identificou três propostas básicas que apresentam apontamentos para a exploração do trabalho indígena na América Portuguesa:
a) Agrupamentos em aldeias maiores para facilitar a catequese e evitar a natural dispersão dos índios. Alterando a tradição nômade ou semi-nômade que predominava nas populações da colônia portuguesa, os jesuítas esperavam obter maiores resultados, dada a escassez de padres e pregadores em relação ao total de índios.
Sendo assim, o aldeamento ou redução indígena, colaborou para uma melhor exploração do trabalho dos nativos, tanto pela questão de armazenamento de indígenas em um determinado local, facilitando a exploração, como, também, a questão do número em pequena quantidade de missionários para administrar um grande contingente indígena.
b) O estabelecimento de uma espécie de encomienda[14] explicitamente ligada aos modelos espanhóis na América, onde cada senhor teria um grupo de índios para converter e manter na fé, obtendo em troca trabalho.
É nesse sentindo que achamos de intensa relevância, caso tivéssemos a oportunidade diante do prazo da elaboração da monografia, delinearmos informações correlacionadas as similaridades dos projetos de colonização da América Espanhola com a da América Portuguesa, no que diz respeito à utilização da mão-de-obra indígena. A documentação levantada no presente trabalho, em alguns casos utiliza o termo encomienda e ‘repartimiento’[15] para designar as relações das reduções e dos trabalhos internos e a questão de ceder mão-de-obra indígena aos colonos por determinado período.
c) Uso da força efetiva contra os recalcitrantes. Apesar dos jesuítas terem condenado amiúde a violência contra os índios e até a omissão diante das guerras intestinas das populações nativas hostis entre si, fez um generalizado encômio às chamadas guerras justas[16].
Enfim, não apenas os textos secundários, o diagnóstico realizado através da obra de Leandro Karnal, mas como também, o levantamento das documentações primárias, nos leva as informações que apresentam esse contexto de utilização da mão-de-obra indígena através de diversos víeis, tanto para o nordeste do Brasil, apresentando características que se aproximam do projeto colonizador da América Espanhola, em especial, no caso particular da “Nova Espanha” – México[17].
Dessa forma devemos considerar as particularidades dos Estados Ibéricos, na medida em que devemos avaliar as especificidades dos aparelhos estatais, e suas orientações referentes às políticas administrativas aplicadas nos territórios coloniais do ‘Novo Mundo’.
A observação da instância administrativa torna-se relevante sobre o prisma dos conflitos de interesses dentro da esfera sócio-econômica, desencadeados pelo posicionamento das respectivas coroas.
As origens da escravidão indígena no Brasil remontam aos meados do século XVI, quando os colonizadores portugueses começaram a intensificar suas atividades econômicas ao longo do litoral. Neste período inicial, o cativeiro dos índios visava solucionar, de uma só vez, dois imperativos da colonização: a questão militar e o suprimento de mão-de-obra para a incipiente economia açucareira. Os grupos que se mostravam resistentes às pretensões dos europeus eram sujeitos às guerras movidas pelos portugueses e seus aliados indígenas e os prisioneiros eram distribuídos ou vendidos como escravos.[18]
De certo modo, pelo menos nos anos iniciais da colonização, as relações luso-indígenas permaneciam subordinadas a uma lógica pré-colonial. Para os portugueses, a presença de cativos nas sociedades indígenas traduzia-se na perspectiva de serem adquiridos cada vez mais escravos através das guerras entre grupos nativos. No entanto, nas sociedades indígenas, o cativo não possuía a conotação de escravo, pois servia para fins ritualísticos e não produtivos. Nesse sentido não é de se estranhar à resistência à venda de escravos, inclusive entre os próprios cativos.
Diante da dificuldade em transformar o cativo de guerra em escravo através do escambo com os índios, os portugueses começaram a lançar mão de outros métodos de captação de mão-de-obra. A apropriação direta de cativos, através de expedições de apresamento, tornava-se o meio mais eficaz de aumentar as reservas de mão-de-obra nativa, porém esbarrava em questões de ordem moral e jurídica.
De fato, devido aos abusos cometidos pelos colonizadores ibéricos na conquista de terras e povos indígenas, foi justamente neste período que se elevaram as primeiras vozes em defesa da liberdade dos índios, ou, talvez mais precisamente, contra o cativeiro injusto. Em termos concretos, esse debate teve ressonância tanto no campo da colonização onde surgiram experiências com outras formas de organização de trabalho, tais como o aldeamento missionário, quanto no campo da legislação, resultando numa longa sucessão de leis e decretos, que apesar de reiterarem o princípio da liberdade indígena, também regulamentavam as condições nas quais os índios pudessem ser legítimos cativos. Dentre estas condições, destaca-se a guerra justa que, em princípio, havia de ser autorizada pela Coroa ou seus representantes.
À primeira vista restritivo, o recurso da Guerra Justa na verdade tornou-se um importante mecanismo para a ampliação do número de escravos. Pouco satisfeitos com a experiência dos aldeamentos jesuíticos, que não forneciam trabalhadores à altura das expectativas, tanto os colonos particulares quanto alguns administradores coloniais, tais como Mem de Sá e Jerônimo Leitão, passaram a organizar poderosas expedições militares que, por um lado, buscavam derrotar os focos de resistência Tupi ao longo do litoral de São Vicente a Paraíba, e, por outro, visavam produzir vultosos números de escravos, destinados a trabalhar na economia açucareira. Não se pode subestimar a importância deste processo articulado de conquista, escravização e desenvolvimento dos engenhos, uma vez que foi justamente neste período, fase ainda incipiente do tráfico de escravos africanos, que houve a mais acentuada expansão açucareira.
Como podemos observar, estava muito intrínseca na administração colonial, essa articulação para os apresamentos indígenas, e, conseqüentemente, a utilização do trabalho do ameríndio na economia colonial, principalmente nos momentos iniciais do processo colonial.
Segundo Nádia Farage, em sua obra Muralhas dos Sertões ela relata sobre a presença de tipologia entre as aldeias missionárias, mas como o livro se concentra na região do Grão-Pará e Maranhão a pesquisa ainda não informou esse tipo de separação entre as aldeias da região da Capitania de Pernambuco.
Os aldeamentos missionários obedeciam a uma certa tipologia, que pode ser assim descrita: aldeias do serviço das ordens religiosas, cuja renda revertia para as mesmas ordens como complementação da dotação que lhes fornecia o Estado; aldeias do Serviço Real, onde os índios aldeados eram utilizados estritamente para o serviço do Estado; aldeia de repartição, cuja mão-de-obra era destinada aos moradores; e finalmente as missões afastadas dos núcleos urbanos que, embora sofressem desfalque de população devido à demanda das expedições, eram unidades autônomas de produção. (FARAGE, 1991: 27)
Se houve essa tipologia nas aldeias do nordeste em geral, provavelmente os índios utilizados nas minas de Buíque, da região sertaneja de Pernambuco, como em outros aldeamentos que eram levantados nas proximidades de empreendimentos econômicos, pertenciam as ‘Aldeias do Serviço Real’, mas não podemos garantir, apenas problematizar, essas lacunas estão servindo de diretrizes a serem exploradas nas pesquisas documentais. Sendo assim, essas brechas encontradas provavelmente não têm condições de serem preenchidas durante o percurso dessa monografia, apenas levantadas.
Se, no século XVI, a escravidão indígena encontrava-se estreitamente articulada à expansão açucareira, esta instituição estendeu-se para outras regiões, no segundo século da colonização, sob uma outra lógica. Nas capitanias do sul, sobretudo a de São Vicente, e no recém-constituído Estado do Maranhão (1621), as atividades econômicas dos colonos eram movidas por numerosos plantéis de escravos índios, aprisionados em freqüentes expedições para o sertão. Embora às vezes vinculadas ao comércio externo, estas atividades geralmente se limitavam à circulação regional ou inter-regional. Próximo a São Paulo, ponto inicial de repetidas incursões em demanda de cativos, constituíram-se inúmeros sítios e fazendas, contando com dezenas e mesmo centenas de trabalhadores nativos. Já no outro extremo da América Portuguesa, nas proximidades de São Luís do Maranhão e Belém do Pará, brotaram igualmente um grande número de unidades de produção agrícola, com consideráveis plantéis de índios.[19]
Como estratégia para reprodução da força de trabalho, as expedições de apresamento mostravam-se eficazes, uma vez que distanciavam o índio de suas origens, geográficas e sociais. De fato, ao longo dos séculos XVI e XVIII, o apresamento representava a principal forma de criar, manter e até aumentar a população cativa, esboçando-se um forte paralelo com o papel exercido pelo tráfico de escravos africanos no mesmo período.
Outra função importante desempenhada pelo índio no esquema produtivo dos paulistas foi no próprio sertanismo. No decorrer do século, a participação ativa de índios nas expedições tornava-se cada vez mais essencial, à medida que se buscavam cativos em locais desconhecidos pelos brancos. Para os colonos, expostos as febres, feras e índios desconhecidos, a mera sobrevivência dependia do conhecimento sertanejo dos índios.
Durante a primeira metade do século XVII, a tropa de resgate representava a principal forma de recrutamento de mão-de-obra indígena. As tropas, devidamente licenciadas pelas autoridades régias, em teoria visavam resgatar índios destinados a serem devorados por seus inimigos. Porém, poucas tropas observavam pontualmente a lei, tornando-se pretextos para a escravização e destruição de inúmeras tribos ao longo dos principais rios da Amazônia. Os armadores dessas expedições geralmente arcavam com o seu custeio, fornecendo armas, correntes, ferramentas e alimentos. Tanto sertanistas quanto armadores contavam, ainda, com a conivência de autoridades corruptas, que permitiam abusos em troca de escravos e outros favores. O Governador Francisco Coelho de Carvalho, por exemplo, ganhou notoriedade enquanto próspero negociante de tapuias, enviados índios para as capitanias do nordeste e até para as colônias espanholas. (DONISETE, 2000: 108)
Observando todo o processo que visava e utilização do trabalho livre ‘compulsório’ e escravo indígena, surge à seguinte questão: por que esta realidade não se encontra explícita na historiografia brasileira?
Na verdade o trabalho escravo colonial permitiu uma dupla extração do excedente econômico, na medida em que era o mercador metropolitano quem vendia o escravo ao produtor colonial, lucrando uma primeira vez; e depois comprava, a preço de monopólio a produção encarecida por esse escravo, revendendo-a com exclusividade ao consumidor metropolitano, lucrando uma segunda vez. Então se observa que se não houvesse lucro da metrópole com a comercialização do escravo africano na colônia, a utilização da mão-de-obra indígena não seria camuflada e provavelmente se desencadearia de maneira similar à utilização da mão-de-obra indígena da América Espanhola, onde os relatos são límpidos sobre o trabalho indígena na região.
Pois qualquer mercadoria produzida por trabalho escravo negro tem um custo superior a sua similar produzida por trabalho assalariado, ou indígena, pois o resultado do trabalho escravo africano incorporava em seus custos de produção dois elementos extras: o custo de aquisição do escravo e o salário do elemento que deveria vigiá-lo. Isto mostra como saia caro para o senhor de engenho o sistema econômico imposto pela Coroa Portuguesa, assim observar-se que a aquisição de escravos africanos e a venda da matéria-prima como a cana-de-açúcar saia caro para o proprietário de engenho.
A partir dessa análise, compreendemos a razão da escravidão indígena ser dificultada, claro que a mesma existia, mas de forma camuflada, e muitas vezes utilizada com exclusividade pelo governo colonial, não facilitando para as empresas como os engenhos de açúcar. A igreja teve um papel fundamental nessa organização, a mesma estabeleceu uma diferença conceitual entre o indígena, considerado gentio, e portanto passível de catequização, e o africano, considerado apóstata, e portanto passível de escravidão. Estando o indígena no interior da colônia, sua comercialização só poderia ser feita por elementos coloniais, o que geraria uma indesejável concentração de renda na colônia, além de impedir o desenvolvimento de um ativo novo ramo do comércio metropolitano, o tráfico de escravos africanos.
Não houve qualquer problema de ‘inadaptabilidade’ indígena no trabalho contínuo, nem questões de ‘sua pouca resistência física’[20], e muito menos razões de sua pouca densidade demográfica, para a não escravidão intensiva dos indígenas. A questão foi uma opção puramente de ordem econômica, como bem demonstra a denominada fase do bandeirantismo de apresamento (1632-1648). Com o domínio holandês no nordeste açucareiro e as rotas do Atlântico Sul, e sua posterior ocupação nos entrepostos portugueses, principalmente na Bahia, viram-se privados do fornecimento de mão-de-obra africana. A solução encontrada foi o ataque, apresamento, e venda dos indígenas concentrados pelos jesuítas nas reduções localizadas nos atuais Uruguai e Paraguai, como escravos para as lavouras de cana-de-açúcar. .
Fica nítido que as regiões que não era favorável à plantação da cana-de-açúcar, direcionáva-se para outras economias, o Maranhão que não dava suporte econômico, e com a crise da segunda metade do século XVII, investiu na caça ao índio. O Maranhão havia se dedicado à venda de escravos indígenas numa época em que a importação de africanos apenas se iniciava. Os solos do Maranhão não apresentavam a mesma fecundidade que os massapês nordestinos para a produção de açúcar.
Segundo Schwartz, o primeiro projeto empregado pelos colonos, consistia na coerção direta sob forma de escravização. O segundo, experimentado pelos jesuítas e a seguir por outras ordens religiosas, foi à criação do campesinato indígena, tornando flexíveis às demandas européias por meio da aculturação e a destribalização. A terceira estratégia foi aplicada tanto por leigos quanto por religiosos. Consistia em entregar aos poucos os indígenas individualmente como trabalhadores assalariados a um mercado capitalista auto-regulável.
A Coroa e a Igreja sempre lutaram pelo direito de controlar o indígena, as duas partes utilizaram maneiras diferentes para obter esse controle, apresentando o indígena como inferior ao branco, toda essa manobra resultou no índio transformado em escravos pelos colonizadores e tutelados pela Igreja.
A metrópole sempre desejou o controle total da colônia, desta maneira compreende-se melhor o comportamento de Portugal diante da sua colônia, concedendo privilégios que possibilitaram a utilização do trabalho indígena tanto para os colonos como para os missionários jesuítas.
Mas como sabemos a economia vai colaborar para ocorrer à intervenção do Estado sobre a utilização da mão-de-obra indígena e obrigar os colonos a adquirir escravos africanos. Essa atitude causou reação contrária por parte dos colonos, uma vez que eles dependiam da mão-de-obra nativa, que teve seu apogeu entre 1540-1570, para assegurar a produção açucareira, base da economia colonial nesse período, haja vista que naquele momento muitos senhores de engenho não possuíam capital e crédito suficientes para comprarem escravos africanos.
Quando o Estado impõe a obtenção só de mão-de-obra escrava africana, os senhores de engenhos não concordam com a situação, afinal estes não tinham condições favoráveis para comprarem escravos negros. Com isso, provavelmente muitos senhores de engenhos continuaram obtendo mão-de-obra indígena, já que esta saída era mais econômica.
Quando a Companhia das índias Ocidentais tomou Pernambuco, em 1630, supõe-se que a imensa maioria dos escravos que trabalhavam nos engenhos eram africanos. Não obstante, embora seja possível precisar quantidades exatas, havia ainda um contingente significativo de índios escravizados. Periodizar a transição do trabalho escravo indígena para o africano é uma questão que preocupa a historiografia brasileira há muito tempo e não é de fácil solução. O problema começa com o próprio termo ‘transição’, que indica uma falsa antinomia, como se num determinado momento os índios deixassem de ser escravizados, sendo substituídos pelos africanos. Na realidade a escravidão indígena e africana conviveram durante séculos, como demonstra as documentações. O que houve foi um aumento gradual da importação de africano, em meio a diminuição da população indígena escravizável. (ANDRADE; FERNANDES; CAVALCANTE. 1999: 179)
Em 1570, Pernambuco possuía 23 engenhos e tanto escravos índios que o excedente podia ser exportado para outras capitanias. Em 1583, ainda em Pernambuco, havia sessenta e seis engenhos e cerca de dois mil escravos africanos. Mesmo assim, os índios ainda representavam dois terços da força de trabalho nos engenhos de Pernambuco.
Diante dos interesses econômicos objetivados pela metrópole, a situação do indígena sempre oscilou, claro que geralmente a metrópole tentou controlar, mas nem sempre com sucesso.
A partir deste impasse, o governo metropolitano determinou que só poderia utilizar o trabalho indígena em cativeiro só quando este fosse aprisionado por meio de guerras justas.
As guerras justas tornaram-se uma saída para a obtenção de mão-de-obra na colônia, esta atividade também era comum na América Espanhola, que mesmo sendo mais comum à utilização da mão-de-obra indígena, a Igreja e o Estado oscilavam muito perante a situação da exploração do trabalho nativo.
Podemos dizer que nunca se chegou a um denominador comum quanto à utilização do trabalho dos ameríndios no Brasil Colonial, se pela liberdade ou pelo cativeiro, sendo sempre a base à alternância de interesses entre coroa, colonos e religiosos. Nesse jogo de poderes, o índio era escravizado ora através da guerra justa, ora era permitida a sua venda em praça pública como indenização à Fazenda Real, como ficou determinado em uma carta régia de 20 de abril de 1708. Nos demais apresamentos realizados por particulares, seriam pagos à Coroa como tributo um quinto do valor da ‘peça’.
Também os índios passaram a ser arrendados, o que na verdade representava uma situação de desgaste semelhante a anterior. Antes, o senhor tinha o título de propriedade do índio, que mesmo custando um quinto do preço do africano merecia zelo, pois representava um capital gasto; por seu lado, o nativo arrendado só valia o preço do arrendamento, não sendo necessário nenhum investimento, como alimentação e outras formas que os preservasse cumprir as tarefas para as quais havia sido alugado.
Se a condição de escravo já era difícil para o indígena, para haver um menor investimento da condição de escravo os senhores latifundiários transformavam os índios em arrendatários, assim investindo menos ainda, pois sendo escravo o senhor iria cuidar, porque investiu um capital para a obtenção do trabalhador, este ficando doente ou vindo a morrer seria prejuízo para o proprietário; sendo arrendados os proprietários não tinham tanta preocupação, assim estes não tinham nem o que comer, afinal se estes moressem não seria tão prejudicial para o seu senhor.
Vale observar a condição a qual os grupos indígenas chegaram, havendo até a escravidão voluntária, isto chega mostrar que em determinadas situações os indígenas chegaram a uma situação similar a do escravo negro no período da abolição, a qual as leis que proporcionava liberdade não eram lucrativas, assim, muitos se ofereciam para continuarem na condição de escravos.
Ao analisarmos estes relatos observamos que houve uma assídua utilização da mão-de-obra indígena no Brasil Colônia, e isto é resultado do processo de colonização que desde o início montou uma estrutura para o controle desta mão-de-obra. Objetivando inserir o índio nos empreendimentos desenvolvidos na colônia e para alcançá-la a Coroa Portuguesa elaborou vários projetos. Essa atividade de apresamento foi inibida posteriormente por puro interesse econômico, afinal as metrópoles possuíam colônias na África, onde havia uma enorme densidade demográfica. Mesmo assim o trabalho indígena permaneceu sendo de extrema importância para a própria coroa necessitada de realizar obras públicas, onde o trabalho indígena seria mais viável diante do altíssimo custo que era a obtenção e manutenção do trabalho escravo africano.

CAPÍTULO IV

A utilização do trabalho indígena nas Entradas para os Sertões
na Capitania de Pernambuco

“Alexandre de Souza Freire senhor da casa de Sousa etc. porquanto por diferentes considerações do serviço de sua alteza, e bom efeito da entrada que ora mando fazer ao sertão a castigar ao gentio bárbaro (na conformidade que sua alteza (sic) se serviu mandar-me, e seus contínuos insultos, e hostilidades estão pedindo) tenho resoluto encarregar o governo de toda agente que val a duas pessoas de grande valor, pratica da disciplina militar, noticias dos sertões, aldeias dos gentios, e experiência da guerra que se lhe há de fazer, para que unidos no zelo, e disposição da mesma entrada, se possa lograr o fim dela com a felicidade que procuro: respeitando eu a particular informação do bem que todas estas qualidades concorrem na de Agostinho Pereira, e Francisco Dias, aos quais juntos se hão de usar na dita jornada. Esperando eu do dito Agostinho Pereira, e Francisco Dias, aos quais juntos se há de entregar o regimento, e poderes de que ora vão.”

O período que compreende a segunda metade do século XVII, é o momento da saída da Companhia das Índias Ocidentais e reestruturação da capitania de Pernambuco, agora enquanto Capitania Régia, integrando-se ao sistema administrativo metropolitano, com um governador nomeado diretamente pelo rei, e não mais com um donatário. O plano da Coroa, nesse momento, era tentar ratificar sua autoridade na região e por fim à fragilidade do seu sistema político.
O período posterior a 1654 foi extremamente difícil para a economia açucareira no Brasil. Segundo Stuart Schwarz, se é verdade que fatores internos penalizaram a atividade produtiva, tais como epidemias, secas e outras calamidades naturais, os problemas mais fortes residiam em fatores externos: o crescimento da concorrência interimperial, com a ascensão da produção antilhana e, a partir de 1680, a conseqüência da inflação dos preços dos escravos, dado o aumento da procura em África. Neste sentido, a Coroa procura uma alternativa para repor as perdas no trato colonial. Expedições ao interior, antes até desencorajadas, passaram agora a receber apoio e mesmo a ser agenciadas pelo governo geral.(PUTONI, 1980: 15)
Figura 01. Mulher Negra
Autor: Albert Eckhout, Séc. XVII.
Nesse momento, com outras regiões plantando cana-de-açúcar e produzindo açúcar, a busca por mão-de-obra africana na no continente africana vai alargar, sendo assim, os preços vão aumentar. Mediante a isso, é que esse conjunto de problemáticas vai dificultar mais ainda na segunda parte do século XVII a obtenção da mão-de-obra africana.
Uma das saídas da Coroa para confirmar era fortalecer novamente a economia, uma forma para realizar isso era adotando novas alternativas econômicas, e já que o litoral encontrava-se desestruturado pelas guerras, havia uma região que prometia riquezas, mas que em geral seu território era desconhecido e ocupado por vários grupos indígenas, essa região era a setaneja[21].
O sertão vai ser a esperança de reestruturação das elites litorâneas, proporcionando expectativas aos colonos de um novo empreendimento que auxilie a economia açucareira que sofre intensa competição no mercado internacional.
Para isso será necessário organizar expedições para abrir caminhos que levem a essas regiões, precisando montar tropas com recursos suficientes para explorar essas áreas consideradas incivilizadas ocupadas por indivíduos considerados bárbaros pelos habitantes do litoral.

“São necessários para a jornada do sertão todos os índios e mestiços das aldeias desta capitania. Com esta vai a lista dos que se podem tirar dessa torre. Tanto que ao receber, os arme de flecharia, e tenham prontos para todas as horas que lhe for aviso se virem a esta praça unir com o mais poder que vai, e além destes se pode ajuntar mais serviços. Faça a sua majestade de uns, e outros disponha uns os animas para que façam sua obrigação como devem, que a câmara desta cidade tem provenir dos resgates para contentar a todos, e em particular encomendo a um (...)”[22]

Tendo em mente que nesse momento as áreas a serem exploradas são desconhecidas e cobertas por vegetação, não é apenas o simples fato de delinear caminhos, mas de abrir literalmente estradas e montagem de acampamentos para dar suporte as tropas. A alimentação não dava conta para todo o percurso transcorrido, sendo assim as paradas estratégicas eram essenciais para o cultivo de alimentos para suprir as tropas na continuação da viagem e até para dar suporte ao retorno. Enfim, era um alto investimento canalizado nessas expedições aos sertões.

“Porquanto o capitão Pedro Borges Pacheco Tesoureiro Geral deste Estado comprou por ordem minha para a jornada do sertão todas as coisas contidas no rol junto firmado de sua mão pelos preços nele declarados que tudo monta 275$610 que estão ainda por pagar(...) satisfaça tudo. Os oficiais da câmara desta cidade mandem logo dar ao dito Tesoureiro Geral do mesmo Senado, a quem por esta se levará em conta (com quitação do mesmoTesoureiro Geral Pedro Borges Pacheco) nas que der de seu recebimento.”[23]

Ao mesmo tempo em que a conquista do sertão era uma saída econômica, a Coroa para fortalecer ainda mais seu discurso utilizou a justificativa do processo civilizador das áreas distantes.

“A conquista do sertão assumiu, assim, um sentido civilizador, pois enquanto região não colonizada, o sertão apresentava-se como a fronteira colonial, significando-se, desde o século XVI, como espaço de mobilidade humana, aproveitado por integrantes da sociedade açucareira tanto como lugar de fuga, quanto como lugar de ascensão social legítima. Assim, durante a fase de conquista, o sertão, fronteira da ‘civilização do açúcar’, foi representado pelo imaginário dominante das vilas açucareiras como o espaço do que era selvagem, perigoso, mas que também prometia riquezas. O sertão era constituído então pelas vizinhanças não colonizadas da zona do açúcar, as matas marginais que limitavam as áreas de engenhos, as serras onde os índios se refugiavam, assim como pelo semi-árido e a caatinga distante.” (SILVA, 2005: 1-2)

E para a realização dessa empreitada foi necessária mão-de-obra para os trabalhos, e no caso da crise vigente da segunda metade do século XVII, onde até a mão-de-obra escrava africana vai ficar onerosa, nada mais prático do que utilizar a mão-de-obra barata indígena. Observamos em muitos empreendimentos econômicos tanto na região litorânea como nessas entradas para os sertões a presença constante do indivíduo indígena como força de trabalho.

“O Provedor-mor da Fazenda Real deste Estado mande dar seis vestidos de raxeta com seu hábito de Cristo e seis chapéus para os índios principais das aldeias do Rio São Francisco que se mandam buscar para a jornada do sertão, e com certidão do Escrivão do tesouro do seu custo, e recibo do Tesoureiro geral da Câmara como se entregaram se levarão em conta ao tesouro geral do estado Pedro Borges Pacheco em 4 de janeiro de 1670.” [24]

As cartas e alvarás solicitando o trabalho indígena vão circular com intensidade na colônia, chegando a oferecer títulos entre outros presentes à obtenção da mão-de-obra dos gentios.
As Jornadas para os Sertões não eram atividades simples, se caracterizava pela formação de tropas formados na sua grande maioria por indígenas aptos a caminhar quilômetros a pé[25], que conhecessem bem o território. Entrar sertões adentro significa enfrentar vários grupos que ocupam essa região, considerados bárbaros, sendo assim a atuação dos indígenas nas tropas era de imensa relevância sendo esses bons conhecedores das táticas de guerra indígena[26].

“Logo que receber esta carta mande prevenir os índios que nessa aldeia houver capazes de macharem de flecharem e os tenha todos prontos para a jornada que mando fazer brevemente ao sertão.” [27]

Essas tropas deveriam ser bem preparadas e armadas, pois o intuito é tomar terras habitadas por outros grupos e de acordo com as circunstâncias tomar o gentio tapuia como escravos para fortalecer esse novo empreendimento, além de servirem como contingentes auxiliadores do povoamento da região. É assim que para o segundo período português vamos observar registros sobre a “Guerra dos Bárbaros”. A mesma vai precisar de um grande contingente de mão-de-obra para os conflitos.
Desde o início da colonização, os indígenas além de sua utilidade como força de trabalho, apareciam como aquele substrato mínimo de povoadores necessário para a manutenção do domínio, frentes ás tentativas de conquista ou de invação de outras potências européias, ou mesmo de resistência por parte de grupos nativos hostis.(FLORESTAN, 1978: 18)
Os aldeamentos indígenas foram de extrema importância na contribuição de ceder contingentes para a realização dos trabalhos nas jornadas ao sertão. Os índios reduzidos nesses empreendimentos estavam envolvidos em várias atividades para manter o aldeamento, além dos mesmos serem essenciais para auxiliar na escolha mais adequada para o levantamento da missão. Os índios trabalhavam na olaria, na agricultura de subsistência, na fabricação de farinha de mandioca, na atividade da criação animal, e entre essas atividades até a própria prática da defesa militar do aldeamento quando atacada por outros indígenas ou por colonos. Os aldeamentos indígenas levantados ao longo dos caminhos das jornadas serviam como ponto de apoio, principalmente com relação a manutenção alimentar das tropas.

“(...) Mandará chamar o feitor do Padre Antonio Pereira para quem leva uma carta do mesmo Padre, o qual lhe entregará um crioulo muito pratico nos caminhos, que será guia até as aldeias dos Payayazes. E faltando mantimento tomará nos currais do dito Padre às rezes, e a farinha que lhe for necessária para por eles se lhe mandar aqui satisfazer. Chegando às aldeias do Payayazes dará ao principal uma carta que lhe leva, e com ele e com seu gentio repartirá das ferramentas que vão aquela quantidade que lhe parece suficiente a encontrá-los, com a esperança de merecer suficiente outra, persuadindo-os que os acompanhe o maior numero que lhe parecerem mais acomodados; sendo primeira de mandar eu fazer guerra aos seus contrários, e serem eles fazer restituir aquelas terras que seus inimigos possuem, por haverem sido de seus antepassados; e que agora devem eles ir a esta guerra, como ofendidos de os mesmos seus contra confeccionarem com peçonha a água de que beberam os seus soldados, quando foram dar-lhe guerra com o ajudante Luis Álvares, de que resultou mover o seu capitão Tario de que fiquei muito sentido. E como os ditos Payayazes são os de quem principalmente pende na presente ocasião o bom sucesso desta jornada, assim por seu valor, respeito que as mais aldeias têm ao seu principal juquerique, e numero de soldados que podem dar, como por serem os guias que dito capitão-mor há de ter,com mais certeza para as aldeias contrarias; lhes hei por muito recomendado os trate com toda a benevolência, e com o juruquerique, e os seus índios seja mais liberal.”[28]

Os conflitos existentes entre os grupos indígenas rivais foram utilizados estrategicamente para influenciar a atuação dos indígenas aldeados nas tropas para os sertões, assim tendo oportunidade de entrar em guerra contra seus inimigos, e os colonos eliminarem ou aprisionarem os gentios considerados bárbaros.

“Alexandre de Souza Freire senhor da casa de Sousa etc. porquanto por diferentes considerações do serviço de sua alteza, e bom efeito da entrada que ora mando fazer ao sertão a castigar ao gentio bárbaro (na conformidade que sua alteza (sic) se serviu mandar-me, e seus contínuos insultos, e hostilidades estão pedindo) tenho resoluto encarregar o governo de toda agente que vai a duas pessoas de grande valor, pratica da disciplina militar, noticias dos sertões, aldeias dos gentios, e experiência da guerra que se lhe há de fazer, para que unidos no zelo, e disposição da mesma entrada, se possa lograr o fim dela com a felicidade que procuro: respeitando eu a particular informação do bem que todas estas qualidades concorrem na de Agostinho Pereira, e Francisco Dias, aos quais juntos se hão de usar na dita jornada. Esperando eu do dito Agostinho Pereira, e Francisco Dias, aos quais juntos se há de entregar o regimento, e poderes de que hora vão fazer a sua alteza, como em todas as mais ocasiões dele, se haverá muito conforme as obrigações que lhe tocarem, e a confiança que faço de seu procedimento. Hei por bem de o eleger, e nomear (como dois capitães-mores da dita entrada, para que como tal o seja, use, e exerça, com todas os honras, graças, franquezas, preeminências, privilégios, isenções, e liberdades que tocam, podem, e devem tocar aos mais capitães-mores, que têm tido as entradas do sertão, e sejam obedecidos de todos os oficiais, e soldados de qualquer qualidade, e nação que sejam, e mais pessoas que de qualquer modo forem a dita entrada. Pelo que o hei por metido de posse do dito posto, de que dará juramento na camada desta cidade, e se fará assento nas costas desta; e ordeno a todos os oficiais maiores, e menores de guerra, e milícia deste Estado, o hajam, honrem, estimem, e reputem por tal capitão um dos dois capitão um dos capitães-mores, que mando façam o mesmo, e o obedeçam, cumpram e guardem todas suas ordens de palavra, ou por escrito, tão pontual, e inteiramente, como devem, e são obrigados. Para firmeza do que lhe mandei passara presente sob meu sinal, e selo de minhas armas, a qual se registrará nos livros da secretária deste Estado, e nos mais a que tocar.”[29]
As entradas aos sertões da Capitania Pernambuco, como ressaltamos era uma saída para encontrar novos recursos para amortecer a crise do litoral açucareiro, tendo em vista que essas áreas seriam mais propícias para a criação do gado e para exploração de áreas propícias a existência de minério. Desde o período dos holandeses na Capitania de Pernambuco que se tinha conhecimento da presença do minério salitre (nitrato de potássio), que era utilizado na confecção da pólvora.
Sua importância na fabricação de materiais explosivos é conhecida desde muito tempo e mereceram o cuidado dos governos preocupados, em maior ou menor extensão, com a defesa de seus domínios. Tratava-se, por um lado, da obtenção de uma das matérias-primas básicas para a produção da pólvora e, por outro, da fabricação da pólvora propriamente dita e do aperfeiçoamento de sua eficiência destrutiva.[30]
Carmem Lúcia autora da dissertação, As Minas de Salitre em Campos de Buíque, relata que Pereira da Costa, que em seu discurso de encerramento da assembléia, em 1640, Maurício de Nassau recomendara a exploração do salitre, cujo minério sabia que existia em Pernambuco. As investigações acerca da presença das jazidas tornaram-se cada vez mais freqüente, e todas as informações reforçavam a abundância do salitre no sertão pernambucano, ao longo e ao norte do rio São Francisco.(CAVALCANTE, 1999:27)
Sendo as jornadas para os sertões uma atividade de forte procedimento militar, já que gerava intensos conflitos com os grupos indígenas que habitavam os sertões, a produção da pólvora em território colonial era um recurso essencial e prático para a manutenção bélica das expedições.
É assim que vamos ter mais um empreendimento resultante das jornadas ao sertão que terá a necessidade de utilizar o trabalho indígena em várias atividades nas localidades da extração do minério. A instalação das minas de salitre no sertão pernambucano vai acarretar a organização de uma estrutura viável que possibilite manter as atividades mineradoras.
Um dos primeiros procedimentos a ser tomado no território foi o levantamento de uma aldeia indígena como ponto de apoio ao trabalho da mineração.

“Para o Governador dos Índios
Sobre se lhe recomendar o sítio da aldeia nas minas do salitre, Dom Sebastião Pinheiro Camarão ao governador de Pernambuco, ordeno que das aldeias que vos são sujeitas, tirei oitenta casais para se formar uma no sítio das minas do salitre. Mando estabelecer no distrito dessa capitania recomendando-lhe a eleição do sítio, para que fique bem acomodada e para o mesmo efeito me pareceu recomendar-vos também esta eleição para melhor o modo, e situação da dita aldeia. Escrita em Lisboa a 2 de dezembro de 1700.”[31]

Além da escolha da área para a elevação do aldeamento indígena para a redução dos indígenas que iriam trabalhar nas minas, surgiam outras necessidades como a construção de um curral, ambos projetos só seriam realizados com a contribuição do trabalho dos indígenas que estavam sendo direcionados para a área.

“Para o Governador e Capitão Geral de Pernambuco
As Minas de Salitre
Dom Fernando Martins Mascarenhas de Lancastro amigo, ore r resoluto e se estabeleção as minas do salitre descobertas no destrito dessa capitania: Me parece ordenar-vos que para esse efeito mande ir logo fazer um curral de gado nos Campos de Buíque na parte mais comodada para as ditas minas, deixando para os pastos de gado toda. A terra que foi necessária arrenondando-se o sítio por hora, enquanto não estão de todo fundada, e estabelecida a fábrica”.[32]
Um outro aspecto relacionado à mão-de-obra indígena é a distinção do trabalho entre os grupos tapuias e os índios pertencentes ao terço de Camarão. Referente ao primeiro grupo as referencias apontam para “a incumbência das tarefas ligadas à agricultura de subsistêcia, ao abastecimento das minas principalmente de farinha ... e bem como ao transporte do salitre até o rio São Francisco, como carregadores”; e em relação aos índios do terço de Camarão, os indígenas eram empregados no serviço das minas. Significando que a esses índios caberia a extração do salitre, talvez por ser uma atividade que exigisse maior qualificação; só eventualmente trabalhavam na lavoura”. .(CAVALCANTI, 1999).
Ao obseravar a diversificada atuação indígena como mão-de-obra no período colonial, percebe-se que esse trabalho resulta em uma pequena janela para essa questão e traz a tona o enorme campo de reflexões que podem ser consideradas e reconsideradas.

Considerações Finais

Diante da problemática levantada, que tinha como objetivo avaliar criticamente a continuidade da utilização da mão-de-obra indígena no ‘Segundo Período Português’, momento esse posterior à expulsão dos holandeses da Capitania de Pernambuco, tivemos como resultado inúmeros exemplos da atuação do indivíduo indígena na cena econômica e social da colônia.
Através de levantamentos em documentações, observamos a existência vigente do trabalho indígena na região do Nordeste colonial, como, também, em outros pontos do território. Ao analisarmos o desenrolar da utilização da mão-de-obra indígena tanto no âmbito legal como no ilegal, observamos por meio do discurso ‘tomista’ – um misto de cristianismo e aristotelismo mais conhecida como ‘escolasticismo’[33], pensamento retirado do período medieval e que disseminou na idade moderna, auxiliando na justificativa da exploração do trabalho indígena.
“Todas as coisas obdecem ao dinheiro e os índios evangelizados são instrumentos para alcançar o ouro.” Assim escrevendo Las Casas no Tratado Comprobatório del Império Soberano.[34] A ‘conquista espiritual’ foi utilizada como um meio de canalizar o esforço, o trabalho indígena para alcançar os interesses da Coroa Portuguesa e dos colonos.
Os textos analisados, em geral os que apontaram esporadicamente ao trabalho indígena foram às dissertações de mestrado e teses de doutorado, sendo enriquecidos por meio de outras fontes bibliográficas.
Esperamos com o presente trabalho, que teve o intuito de edificar um breve compêndio sobre ‘trabalho indígena’, que o mesmo possa auxiliar futuras pesquisas que seguem a linha da ‘história indígena’, colaborando para a construção de um novo olhar sobre ‘o índio’. Começando já de forma crítica a avaliação do próprio termo ‘índio’, fomentando um olhar aguçado a cerca dos grupos étnicos que aqui se encontravam em abundância durante a chegada dos europeus, e os mesmos que se inseriram no panorama sócio-cultural edificado em território colonial.
Sua ausência por muitas vezes nas documentações é um reflexo do desejo da época, em que ser índio, ser descendente de índio era algo desfavorável à cultura barroca. Tiveram a necessidade de apresentar para o mundo a construção de um território civilizado, onde o indígena estaria sendo educado nos aldeamentos missionários religiosos ou estariam mortos.
A história faz seus diversos papeis, nós como historiadores tentamos fazer o nosso. Personagens de ontem, personagens de hoje, personagens de amanhã... o papel da história é desvendar e refazer a colcha de retalho historiográfica. Tentaremos desconstruir, construir e reconstruir os mesmos personagens toda vez que for necessário.

Referências Bibliográficas

ALENCASTRO, Luis Felipe de. O Trato dos Viventes: Formação do Brasil no Atlântico Sul. São Paulo: Ed. Companhia das Letras, 2000.
BARROS, Paulo Sérgio. Confrontos Invisíveis: Colonialismo e Resistência Indígena no Ceará. Dissertação de Mestrado em História, UFPE, 1997.
BARTIRA, Ferraz Barbosa. Índios e Missões: A Colonização do Médio São Francisco Pernambucano Séculos XVII e XVIII . Dissertação de Mestrado em História, UFPE, 1991.
BETHELL, Leslie. História da América Latina: América Latina Colonial. Vol. II. São Paulo: Ed. Edusp, 1999.
BRUIT, Héctor Hernan. Bartolomé de Las Casas e a Simulação dos Vencidos. São Paulo: Iluminuras, editora da UNICAMP, 1995.
BRUST, Monique da Motta. “Os Testemunhos do Corpo”: a construção da imagem do corpo indígena no Brasil colonial (séculos XVII e XVIII). Dissertação de Mestrado em História, UFF, 2003.
CARVALHO, Marcus J. M. de. Negros da Terra e Negros da Guiné: os termos de uma troca, 1535-1630. Revista do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro. R IHGB, Rio de Janeiro, ª 161, n. 480, pp. 21-590, Jul/Set. 2000.
CARVALHO, Marcos. Pernambuco e Angola: negros e índios em Pernambuco. In FERNANDES, Eliane Moury; CAVALCANTE, Sandra Melo. Tempo dos Flamengos & Outros Tempos. Recife: Ed. Massangana da Fundação Joaquim Nabuco, 1999.
CAVALCANTE, Carmen Lúcia Lins. As Minas de Salitre em Campos de Buíque: um caso de utilização da mão-de-obra indígena na Capitania de Pernambuco (1698-1706). Recife: 1999, Dissertação de mestrado em História.
Beatriz G. Dantas, José Augusto L. Sampaio e Maria Rosário G. de Carvalho. Os povos
indígenas no nordeste do Brasil, um esboço histórico. In CUNHA, Manuela
Carneiro. História dos Índios no Brasil. São Paulo: Ed. Companhia das Letras,
1998.
EISENBERG, José. As Missões Jesuíticas e o Pensamento Político Moderno: encontros culturais, aventuras teóricas. Belo Horizonte: Editora UFMG, 2000.
ELIAS, Juliana Lopes. Militarização Indígena na Capitania de Pernambuco Século XVII: Caso Camarão. Tese de Doutorado em História, UFPE, 2005.
FARAGE, Nádia. As Muralhas dos Sertões: os povos indígenas no Rio Branco e a colonização. São Paulo: Paz e Terra ANPOCS, 1991.
FERRAZ, Márcia Helena. A Produção do Salitre no Brasil Colonial. Nova Química. Centro Simão de Estudos em História da Ciência / PUC – SP – CESIMA, São Paulo, jun/2000.
FUENTES, Carlos. O Espelho Enterrado: reflexões sobre a Espanha e o novo mundo. Rio de Janeiro. Ed. Rocco, 2001.
FURTADO, Celso. Formação Econômica do Brasil. São Paulo: ed. Nacional, 1979.
KARNAL, Leandro. “Formas de Representação Religiosa no Brasil e no México do Século XVI”. Tese de Doutorado, USP, 1994.
LOPES, Fátima Martins. Missões Religiosas: índios, colonos e missionários na colonização do Rio Grande do Norte. Recife:1999, dissertação de mestrado.
MELATTI, Júlio César. Índios do Brasil. 3ºed. São Paulo: Ed. HUCITEC, 1980.
MONTEIRO, John. O Escravo Índio, esse Desconhecido. In DONISETE, Luís; GRUPIONI, Benzi. Índios no Brasil. 3ª ed. São Paulo: Ed. Global, 2000.
MORAES, Reginaldo C. Corrêa. Atividade de Pesquisa e Produção de Texto. 2ª ed. São Paulo: IFCH/UNICAMP, 2000.
NETO, Manuel Pacheco. Palmilhando o Brasil Colonial: a motricidade de bandeirantes, índios e jesuítas no século XVII. Dissertação de mestrado, UFMS, 2002.
PIRES, Maria Idalina da Cruz. “A Guerra dos Bárbaros”: resistência e conflito no nordeste colonial. 2ª ed. Recife: Ed. Universitária UFPE, 2001.
PUTONI, Pedro. A Guerra dos Bárbaros: povos indígenas e a colonização do sertão nordeste do Brasil, 1630-1720. São Paulo: 1998. Tese de Doutorado para o programa de pós-graduação de História Social da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da Universidade de São Paulo.
RAGO, Margaretti; GIMENES, Renato Aloizio de Oliveira (ORGS). Narrar o Passado, Repensar a História. Coleção Idéias 2, São Paulo: Unicamp, 2000.
REZENDE, Cyro. História Econômica Geral. São Paulo: Ed Manuais Contexto, 2000.
RIBEIRO, Berta Gleizer. O Índio na História do Brasil. 3. ed. São Paulo: Global, 1989
SILVA, Geyza Kelly Alves. Índios e Identidades: formas de inserção e sobrevivência na sociedade colonial (1535-1716). Dissertação de Mestrado em História, UFPE, 2004.
SILVA, Kalina Vanderlei. O Miserável Soldo & a boa ordem da sociedade colonial: militarização e marginalidade na Capitania de Pernambuco dos séculos XVII e XVIII. Recife: Fundação de Cultura Cidade do Recife, 2001.
SILVA, Kalina Vanderlei. Os Pobres do Açúcar na Conquista do Sertão de Pernambuco nos Séculos XVII e XVIII. Tese de Doutorado em História, UFPE, 2003.
SILVA, Kalina Vanderlei. O Segundo Período Português: a Construção de Pernambuco enquanto Capitania Régia. Revista do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro. RIMGB, Rio de Janeiro, a 161, n. 408, pp. 21-590.
jul/set. 2000.
TODOROV, Tzvetan. A Conquista da América: a questão do outro. São Paulo:Ed. Martins Fontes, 1999

Notas
[1] A Insurreição Pernambucana uniu na luta contra os holandeses colonos portugueses, índios, africanos escravizados e proprietários de engenhos.
[2] Diante das dificuldades econômicas, tudo tinha de ser feito sem onerar os cofres da Coroa, pois na época do processo colonizador das Terras do Brasil, a metrópole passava por grave crise financeira, principalmente em decorrência do declínio do comércio com o Oriente. O governo português havia feito empréstimos elevadíssimos junto aos banqueiros de Flandes, nos Países Baixos, e não tinha como saldar a dívida. Para complicar a situação, em 1531 Lisboa foi arruinada por um terremoto e precisava ser reconstruída. Todo esse panorama contribuiu para a adoção do projeto das Capitanias Hereditárias nas possessões lusitanas.
[3] RAGO, Margaretti; GIMENES, Renato Aloizio de Oliveira (ORGS). Narrar o Passado, Repensar a História. Coleção Idéias 2, São Paulo: Unicamp, 2000, pág. 9.
[4] RAGO, Margaretti; GIMENES, Renato Aloizio de Oliveira (ORGS). Narrar o Passado, Repensar a História. Coleção Idéias 2, São Paulo: Unicamp, 2000, pág. 10.
[5] VIEIRA, Maria do Pilar; PEIXOTO, Maria do Rosário; KHOURY, Yara Maria Aun. A Pesquisa em História. 4ª ed. São Paulo: ed. Ática, 1998, pág.
[6] MORAES, Reginaldo C. Corrêa. Atividade de Pesquisa e Produção de Texto. 2ª ed. São Paulo: IFCH/UNICAMP, 2000, pág. 5.
[7] MORAES, Reginaldo C. Corrêa. Atividade de Pesquisa e Produção de Texto. 2ª ed. São Paulo: IFCH/UNICAMP, 2000, pág. 5.
[8] SILVA, Kalina Vanderlei. O Miserável Soldo & a boa ordem da sociedade colonial: Militarização e marginalidade na Capitania de Pernambuco dos séculos XVII e XVIII. Recife: Fundação de Cultura Cidade do Recife, 2001, pág. 16.
[9] O Segundo Período Português, termo utilizado pela historiadora Kalina Vanderlei em sua obra ‘O Miserável Soldo & a boa ordem da sociedade colonial’, para designar os anos pós-expulsão holandesa da Capitania de Pernambuco. Período esse que se caracterizou por um aprofundamento da economia no setor açucareiro, seja pelo fato de diversos engenhos destruídos durante o conflito entre colonos x holandeses, como também a problemática que estava passando o açúcar com a concorrência no mercado internacional.
[10] SILVA, Kalina Vanderlei. O Segundo Período Português: A Construção de Pernambuco enquanto Capitania Régia. Artigo, pág. 161.
[11] Conflito entre grupos étnicos da região sertaneja das Capitanias do Norte contra os desbravadores dos sertões (colonos), muitos especializados na caça ao índio, profissionais conhecidos como bandeirantes.
[12] Potosí é uma mina de prata que se localiza atualmente no território Boliviano, tendo sido explorada desde o período pré-colombiano na região do Império Incaico, foi de imensa importância para a economia do período colonial na América Espanhola. Possuía tal importância que a Coroa Portuguesa investia em missões para o oeste em busca dos caminhos que levasse a Potosí.
[13] A agricultura no período colonial na América Espanhola era em geral para a subsistência, essa unidade de produção era conhecida como haciendas ou fazendas em português. As haciendas vão destacar-se mais nos últimos momentos do período colonial. Para o território explorado pela Espanha, a economia se declinou mais expressamente para a exploração das minas, enquanto na América Portuguesa colonial teve como sustentáculo a monocultura canavieira, as explorações de minérios para a região das Capitanias do Norte ficaram em segundo plano, só se evidenciando com intensidade no século XVIII com o minério e pedras preciosas encontradas na região de Minas Gerais. A economia aurífera do século XVIII no Brasil Colônia produziu mais minério do que os primeiros séculos de exploração na América Espanhola.
[14] Instituição característica da colonização espanhola na América. Juridicamente era um direito outorgado pelo monarca em favor de um súdito espanhol (encomendeiro) para receber os tributos ou trabalhos que os súditos índios deviam pagar à Coroa. Em troca, o encomendeiro devia cuidar do bem-estar espiritual e terreno dos índios, assegurando sua manutenção e proteção, assim como sua doutrinação cristã.
[15] Prestação de serviços às empresas coloniais, atingia os homens adultos das aldeias, cada comunidade deveria ceder periodicamente uma certa quantidade de trabalhadores, sendo cada turno de repartidos sorteados pelas chefias aldeãs (insentos de tributações), teria que ter o cuidado de que o envio de trabalhadores fosse adequado a disponibilidade da aldeia, de modo a não alterar a subsistência da comunidade. Sorteado os índios, estas eram enviados ao juiz repartidor do corregimento aí encaminhado aos interessados em contratá-lo. O tempo de trabalho variava de semanas a meses, os índios deveriam receber um salário parte do geral obrigatoriamente em moeda, que pudesse pagar o tributo régio. No Peru conhecido com Mita e no México Cuatéquil.
[16] Guerras Justas era um procedimento onde os colonos aprisionavam os índios no caso de conflitos entre eles, os indígenas relutando em ser catequizando, enfim, impondo obstáculos ao processo de catequização na América, neste caso os colonos poderiam escravizá-los.
[17] A administração orientada pela metrópole ‘Coroa Espanhola’, batizou suas terras colônias utilizando por muitas vezes o termo ‘Nova’. Nova Espanha para o México e Nova Granada para a Colômbia.
[18] DONISETE, Luís; GRUPIONI, Benzi. Índios no Brasil. 3ª ed. São Paulo: Ed. Global, 2000. Cap. O Escravo Índio, esse Desconhecido, John Monteiro, pág. 105.
[19] DONISETE, Luís; GRUPIONI, Benzi. Índios no Brasil. 3ª ed. São Paulo: Ed.Global, 2000. Cap. O Sertanismo de apresamento século XVIII, pág. 108.
[20] NETO, Manuel Pacheco. Palmilhando o Brasil Colonial: a motricidade de bandeirantes, índios e jesuítas no século XVII. Pág. 110.
[21] Quando nos referimos à palavra sertão em documentações do período colonial temos que ter cuidados. Ver o trabalho ‘As Representações do Sertão no Imaginário Barroco Açucareiro Entre os Séculos XVI e XVIII de Kalina Vanderlei, segundo a autora o sertão colonial foi definido enquanto sertão a partir da construção de uma imagem de deserto de súditos no século XVI. Tal imagem se baseava, não no fato de ser essa região um deserto físico, mas pela ausência de exploração econômica efetiva que a caracterizaria como um espaço civilizado. Não existia um único sertão, mas diversos: toda região para além da colonização, em suas fronteiras, era um sertão. E tal conceito tinha pouco de geográfico, importando pouco as características climáticas, de relevo, vegetação. Além disso, com a expansão gradativa da conquista e colonização, o sertão era um espaço sempre em mutação.
[22] Coleção de Documentos Históricos. Volume III, pág. 228 (19/10/1654))
[23] Coleção de Documentos Históricos. Volume VI, pág. 424 (26/09/1669)
[24] Coleção de Documentos Históricos. Volume VI. Pág. 430 (04/01/1670)
[25]
[26] Ver em Militarização Indígena na Capitania de Pernambuco no século XVII: Caso Camarão. Tese de doutorado de Juliana Lopes Elias defendida na UFPE que aborda a atuação da tropa militar de Camarão composta por grupos indígenas.
[27] Coleção de Documentos Históricos. Volume III. Pág. 217-218. (__/10/1654)
[28] Coleção de Documentos Históricos. Volume V. Pág. 321-327. (1658)
[29] Coleção de Documentos Históricos. Volume V. Pág. 328. (1658)
[30] FERRAZ, Márcia Helena. A Produção do Salitre no Brasil Colonial. Nova Química. Centro Simão de Estudos em História da Ciência / PUC – SP – CESIMA, São Paulo, jun/2000. http://www.sbq.org.br/publicacoes/quimicanova/qnol/2000/vol23n6/20.pdf acesso: 27/01/07.
[31] Arquivo Histórico Ultramarino. Pernambuco, Caixa [ ? ], Códice 257, folha 60, (02/12/1700).
[32] Arquivo Histórico Ultramarino. Pernambuco, Caixa [ ? ], Códice 257, folha 59, (02/12/1700).
[33] A idéia aristotélica de que alguns homens, por natureza são seres políticos e outros não, o que divide a humanidade em homens livres e superiores e servos por natureza, serviu de fundamento a teólogos e juristas, como Ginés de Sepúlveda, para justificar a conquista e servidão dos indígenas.
[34] BRUIT, Héctor Hernan. Bartolomé de Las Casas e a Simulação dos Vencidos. São Paulo: Iluminuras, editora da UNICAMP, 1995. pág. 90.

Nenhum comentário: